Padre Frank Pavone entrevista o psicólogo e psiquiatra Dr. Philip Ney.
Pe. Pavone: Sou muito privilegiado em receber Dr. Philip Ney, que tem feito uma extensa investigação sobre os efeitos do aborto, não apenas sobre quem passa por ele mas nas crianças sobreviventes e o impacto que o aborto tem sobre toda a nossa sociedade.
Dr. Ney, muito obrigado por estar conosco e eu espero que você partilhe um pouco sobre o trabalho que tem realizado ao longo dos anos com os fenômenos pós-abortivos. Como você se envolveu com esse trabalho?
Dr. Ney: Boa pergunta, Frank. Eu sou um psiquiatra infantil e de família, e também sou psicólogo infantil.
Anos atrás, uma mãe veio a mim e disse “eu tenho este lindo bebê, um marido maravilhoso que me apoia, um lindo lar, tive um bom parto e uma bela gestação, mas eu não consigo tocar nesta criança.”
Tenho feito investigações em abuso infantil e escrito uma série de artigos acadêmicos, então eu tenho que pensar: o que está errado?
Veja só, todas as coisas que você pensaria estão bem; entretanto, a mãe não consegue tocar o seu bebê. E, claro, o que acaba surgindo é que ela teve um aborto na gravidez anterior. Então eu tenho que pensar: qual é a conexão? Existe alguma ligação entre um aborto e a dificuldade, mais tarde, de se vincular com uma criança? Essa é uma questão que temos investigado nos últimos 20 anos. E resulta que é o caso.
Infelizmente, falando estatisticamente e tenho que dizer isso com muito cuidado, falando estatisticamente as mulheres que tiveram abortos são menos suscetíveis a se vincular com os próprios filhos e, consequentemente, essas crianças são mais suscetíveis a serem abusadas e negligenciadas.
Além disso, mulheres que foram abusadas e negligenciadas quando crianças são mais propensas a ter abortos. E posso dizer que em qualquer lugar onde tenho dito isso, em qualquer tipo de audiência, as pessoas ficam realmente muito chateadas, às vezes com muita raiva. Mas acho que posso afirmar após ter investigado o tema ao longo de tantos anos e de ter publicado vários artigos que estatisticamente existe uma conexão significativa. Isso não quer dizer que cada mãe que tem um aborto é uma mãe ruim, simplesmente não é verdade. Mas sim que existe algo que temos que examinar cuidadosamente, porque as pessoas estão muito preocupadas com o aumento da taxa de abuso infantil e negligência. Então essa é uma área. E foi assim que começou.
Desde aquela época, como você sugere, tenho considerado todos os tipos de outras conexões. E há múltiplas conexões e elas parecem ser conexões internas. Isso faz você pensar sobre coisas como a ecologia humana e o que estamos fazendo contra a humanidade.
Pe. Pavone: Fale um pouco sobre os outros efeitos que o aborto tem sobre toda a família e a sociedade.
Dr. Ney: Claro. Bem, outra coisa óbvia uma vez que sou psiquiatra infantil, é que eu falo com as crianças. E logo vem à minha atenção nas entrevistas com crianças que eles começam a suspeitar ou que eles francamente sabem que um de seus irmãos foi abortado. Nesse caso, como é então crescer em um lar onde você suspeita ou sabe que um de seus irmãozinhos antes de nascer foi abortado? Isso cria toda uma série de conflitos muito, muito profundos; que hoje chamamos de Síndrome do Sobrevivente Pós-Aborto [Post-Abortion Survivor Syndrome].
Eles têm em comum muitos dos conflitos que foram encontradas nas pessoas que sobreviveram ao Holocausto. Por exemplo, eles sentem culpa por sobreviver. Eles sentem que não está certo que eles estejam vivos. E eles se perguntam por que eles deveriam ser selecionados quando os seus pequenos irmãos foram selecionados para morrer… que é precisamente o que aconteceu com as pessoas do Holocausto. Por que eles foram selecionados para viver e alguns de seus amigos, parentes e familiares foram selecionados para morrer? Isso deixa esse profundo sentimento de culpa. Isso é uma coisa muito, muito difícil de tratar porque está tão profundamente enraizado. E claro, nessa situação, como você pode confiar nos seus pais? São eles capazes de matar você também? Eles mataram um de seus irmãozinhos. Então isso se resume em um dos medos mais profundos de toda criança, que é de que os meus pais me matem e me comam. E, é claro, você vê isso em histórias infantis como a de Hansel e Gretel, em que a bruxa vai colocá-los no forno. Em várias culturas, em várias partes do mundo, todas têm profundamente enraizada esse medo muito profundo que as crianças têm de que os seus pais os possam matar e comer. E, obviamente, o aborto se aproxima muito disso. E por isso cria uma enorme desconfiança em relação aos pais. E se você não pode confiar em seus pais, então é provável que você não vá confiar em figuras como a dos pais: a dos professores e de todas outras… como a dos sacerdotes.
Como você pode confiar em pessoas assim que tiram a vida, a vida inocente, ou que não a protegem tanto quanto deveriam?
Então em qualquer caso existe esta vasta gama de sinais e sintomas de um conflito profundo engendrado pelo fato de que eles são sobreviventes, sobreviventes de abortos. Então essa é uma das outras áreas.
Em seguida há outra área que, evidentemente, é realmente importante para mim: O que isso faz para a profissão médica? Eu gastei tempo com pessoas que estão preocupadas em como isso as afeta e em como isso as afetou se elas fizeram ou não fizeram abortos. Essa é uma importante área de estudo que estamos engajando. E, certamente, nós temos em vista o impacto do aborto nas famílias em geral e, particularmente, nos maridos. Isso não tem sido devidamente estudado. E, finalmente, consideramos toda a questão do que aborto faz para a saúde em geral, os componentes bioquímicos. Nós estamos fazendo algumas pesquisas nessa área. Logo, temos cerca de cinco projetos de investigação em curso, e quando eu tiver tempo e se encontrar os recursos financeiros, irei fazer mais estudos, escrever mais documentos e fazer mais apresentações para os meus colegas e obter tudo publicado o mais rápido que puder em revistas científica.
Pe. Pavone: Você acha que quando a pesquisa é feita nessas diversas áreas que lidam com um tema que é tão sensível e explosivo como o aborto, existe qualquer dificuldade em particular para que esses artigos de pesquisa sejam publicados?
Dr. Ney: Sim, sim. É triste dizer – e eu fiz parte de quadros editoriais de revistas e sei como eles funcionam, e em como verdadeiramente em seus corações eles querem fazer o que é certo e publicar coisas boas – mas há certa cegueira para certas coisas que eles já concluíram que não podem existir. E quando eu publico coisas sobre a conexão entre o abuso infantil e o aborto, muitos dos meus colegas, sem ler os estudos, ficam com muita raiva – não contra o estudo ou para criticar o estudo, eles ficam com raiva de mim. O velho argumento ad hominem. Acho que é realmente triste, porque se nós vamos abordar isso cientificamente, nós temos que manter as nossas mentes abertas e eu temo que alguns dos meus colegas não mantém as suas mentes abertas sobre estas questões.
Pe. Pavone: Eu, no curso de minhas viagens, ao lidar exclusivamente com o problema do aborto, tenho encontrado e tenho desenvolvido amizades com alguns daqueles que forneceram abortos no passado. Eu sei que uma boa parte do seu trabalho é lidar diretamente com essas pessoas e ajudá-las a encontrar a cura. Você pode falar um pouco sobre esse trabalho específico?
Dr. Ney: Sim, posso. Temos feito um estudo e temos gasto tempo aconselhando as pessoas que agora pararam de fazer abortos. E tanto pelas observações clínicas quanto pelos dados que temos recolhido, acho que agora é possível descrever o acontece que leva para a indústria do aborto e o que chama a sair dela. Então, o que nós temos tentado fazer é proporcionar às pessoas um modelo que as ajude a entender por que elas chegaram ali e a melhor forma de sair, se elas quiserem sair. E sendo um sacerdote, Frank, você entenderia este modelo. No Antigo Testamento, a congregação vinha e confessava os seus pecados ao sacerdote, o sacerdote colocava as mãos sobre a cabeça de um pequeno cordeiro, um cordeiro novo perfeito, sem mancha ou defeito, e então alguém era designado para conduzir este cordeiro para o deserto onde ele deveria morrer, tinha que morrer. E era muito interessante, por exemplo, se você ler a tradução da Nova Jerusalém, ele é um “homem adequado, que esta ali”. E você tem que se perguntar: aqui está um bom rapaz, ele é, obviamente, um sujeito de boa reputação, o que ele está fazendo lá? Será que ele quer este trabalho? Em qualquer caso, o sacerdote diz que tudo bem você vai fazer isso para o resto da congregação. Então, agora ele se torna o carrasco do bode expiatório, o bode que é sacrificado.
Então hoje essas pessoas que fazem os abortos são os executores dos bodes expiatórios que são as criancinhas que ainda não nasceram. E todos os problemas não resolvidos da sociedade e a tristeza, a raiva são canalizados para essas crianças não nascidas e alguém tem que fazer isso. E essas pessoas estão interessadas, elas estão ali, e, geralmente, eles são adequadas, elas não são idiotas e elas sabem o que estão fazendo, em certa medida.
Assim, a maioria dessas pessoas passaram por situações realmente traumáticas, do tipo que as encurrala para essa direção. E quando elas estão tentando entender o que lhes aconteceu e entender o processo pelo qual elas saem disso, elas também têm que compreender todos os fatores que as predispõem para esse tipo de atividade. E isso significa uma boa dose de olhar para si mesmo, para a própria história, descobrir os conflitos chave que te predispõem para esse tipo de coisa. E como seria de esperar é interessante porque no que se refere a medicina, aí se encontram os melhores e os piores tipos de prática. Isso é, se têm a oportunidade de realizar partos de bebês, e pergunte a qualquer médico de idade, pergunte o que ele mais gosta, o que eu mais gostava quando era um estudante, eu gostava de partos de bebês. E por outro lado eles fazem a execução do bode expiatório… e matam.
E esta é uma enorme contradição. Mas você sabe que historicamente antes do tempo de Hipócrates, o médico tinha uma dupla obrigação, que é de curar se eles pudessem e se eles não pudessem curar, de administrar cicuta ao paciente [envenenamento]. E essa dupla obrigação, quando chegou a Hipócrates e a esse ponto da história grega, Hipócrates basicamente disse que isso não estava funcionando, que ninguém nunca confiaria em nós se nós tivéssemos essa dupla responsabilidade. Então nós iríamos descartar essa parte da nossa obrigação, que é matar, e só curar. E sob nenhuma circunstancia matar. E, claro, o que está acontecendo é a corrosão gradual e os médicos estão voltando para as três práticas pré-hipocráticas que Hipócrates tentou parar, que é não ter cicuta prontamente disponível para matar pessoas, não abortar as pessoas e não ter relações sexuais com os pacientes. Infelizmente na medicina atual há pessoas sendo abortadas, há a eutanásia e há relações sexuais. E aí você começa a perceber porque a medicina… porque a prática da medicina e da profissão médica está perdendo credibilidade.
Então eu não sei se eu estou respondendo a sua pergunta muito bem, mas existem todos esses componentes interligados. O que isso causa ao bebê é óbvio, o que isso causa a mãe nós temos estudado intensamente e publicado na área. O que isso causa aos irmãos, está publicado na área. O que isso causa ao médico. E obviamente o que isso causa na família como um todo.
Pe. Pavone: Como as pessoas podem obter os livros que você escreveu sobre esses vários temas?
Dr. Ney: Bem, alguns destes livros estão publicados em diferentes partes do mundo. Um dos livros, Ending the Cycle of Abuse [Acabando com o ciclo de abuso], está publicado em Nova York pela Taylor Francis. Os outros estão publicados no Canadá, pela Pioneer Publishing, e se eles estão interessados em me escrever eu posso me certificar que eles obtenham uma cópia. Um dos livros mais recentes é Deeply Damaged [Profundamente Machucada], que é uma tentativa de explicar alguns desses fenômenos e inclui uma quantidade razoável de dados científicos. Se as pessoas estão interessadas em artigos científicos e dados das práticas, devem ler esse. E depois há o Treatise on Love [Tratado sobre o Amor], que é uma perspectiva bíblica de psiquiatria ou perspectiva psiquiátrica da Escritura. Há um sobre o que chamamos de Sociedade dos Centuriões, os ex-abortistas. E depois há um panfleto, sobre como conversar com o seu filho se você teve um aborto. E eu acho que você deveria. E também há um livreto sobre os sobreviventes de aborto.
Pe. Pavone: Bem, nós certamente prezamos todo o trabalho que você tem feito e está fazendo, quero lhe garantir a nossa cooperação dos Sacerdotes pela Vida e do Pontifício Conselho para Família do Vaticano. Reconhecemos a incrível necessidade que existe para mais desta pesquisa, a necessidade que há de alcançar a cura e a compaixão para todos os que foram feridos pela tragédia do aborto – de todos incluídos, como vemos mais e mais a partir de sua pesquisa, todos nós.
Dr. Ney: Acho que está certo, Frankl. Acho que isso afeta a todos nos afinal.
Pe. Pavone: Dr. Ney, muito obrigado e que Deus te abençoe.
Dr. Ney: Deus te abençoe também. Obrigada por seu trabalho.
Fonte: Priests for Life