Afinal, a chamada “pílula do dia seguinte” é abortiva ou não?
Embora a imagem de um aborto em gestações avançadas cause o horror em muitos, o que é perfeitamente natural, o mesmo não acontece quando se fala de abortos feitos em gestações que estão bem no início, onde o ser humano já gerado lembra bem pouco sua forma física quando de seu nascimento. Talvez isto se deva porque temos a tendência a encarar o aborto por imagens que nos causam horror, tais como sangue, dor, choro, etc., mas a verdade é que esta nossa tendência leva-nos a minimizar ou evitar lidar com o que o aborto realmente é: a eliminação de uma vida humana frágil, inocente e que não pode se defender da agressão que sofre.
Apenas tendo em mente o efeito real e procurado de um aborto, de cada aborto, é que se pode entender que o mal reside não no que imaginamos que seja um aborto, mas em seu efeito final, que é a eliminação de um ser humano já concebido. E isto independe se este ser humano já foi concebido há 9 meses, 12 semanas ou apenas há 1 minuto. O que se defende é a vida do ser humano desde a sua concepção até seu fim natural.
A essência do aborto é exatamente a procura deliberada pela eliminação deste novo ser humano. A forma como se busca eliminá-lo é meramente acidental. Seja nas mãos de um inescrupuloso médico aborteiro em uma clínica que siga todas as normas sanitárias ou seja tomando uma pílula na privacidade do próprio lar e que poderá ter um efeito abortivo em um ser humano recém-concebido, nestes dois extremos a forma como é feito o aborto é apenas um detalhe perto do mal real que é a eliminação deste ser humano.
É devido a esta falta de visão do mal real do aborto que até mesmo pessoas em geral contrárias ao aborto toleram abortos que não teriam a “aparência” de um. É o que acontece com a pílula do dia seguinte, por exemplo. Imaginar que ela funciona apenas como uma “contracepção de emergência” evita, para muitos, que se tenha de tocar em pontos sensíveis. Eu mesmo preferiria que os dados mostrassem que não há qualquer possibilidade de que esta droga tenha efeito abortivo, mas não é o que acontece, como o próprio fabricante afirma.
Um dos efeitos desta droga pode ser a criação de condições que impeçam a implantação do óvulo já fertilizado no útero. Ou seja, ocorreu a geração de um novo ser humano, mas este seria eliminado por causa da falta de ambiente intra-uterino propício ao seu desenvolvimento. Não haveria sangue, não haveria choro, não haveria dor imposta ao bebê, mas sua eliminação é a mesma, e é exatamente esta a essência do aborto.
Note-se bem que eu não escrevo que a pílula do dia seguinte É abortiva. O mais correto é afirmar que ela PODE ser abortiva, e isto é de suma importância. Os cientistas até o momento não conseguiram desenvolver uma droga que com 100% de certeza atue de forma que não aconteça a fertilização. Como já indicado em uma postagem aqui no blog (uma nova versão do artigo citado pode ser lida aqui), os cientistas James Trussell e Elizabeth G. Raymond, dizem que é necessário informar as mulheres sobre todos os efeitos possíveis no medicamento:
“Para fazer uma escolha consciente, as mulheres devem saber que a contracepção de emergência [Pílula do Dia Seguinte], como todos os contraceptivos hormonais tais como pílulas anticoncepcionais, implantes hormonais, anéis vaginais, adesivos hormonais, injetáveis e até mesmo a amamentação — previnem a gravidez através do adiamento ou da inibição da ovulação ou inibição da fertilização, mas pode também inibir a implantação de um óvulo fertilizado no endométrio.” (destaque meu)
“PODE inibir a implantação de um óvulo fertilizado”. Ou seja, há sim a possibilidade de que após a concepção um novo ser humano seja eliminado de forma deliberada através desta droga.
Alguém pode perguntar: quem é este dr. Trussell, que admitiu tal coisa? Ele é diretor do Departamento de Pesquisa Populacional da Universidade de Princeton. Mas não apenas isto, ele também é membro do Comitê Médico Nacional da Planned Parenthood (a maior rede de clínicas de aborto do mundo), é colaborador do Guttmacher Institute (o braço de pesquisas da Planned Parenthood) e também é membro do Conselho da NARAL Pro-Choice America Foundation (ONG abortista dos EUA). Somado a tudo isto, ele também é responsável por um website que tem por objetivo promover o uso da pílula do dia seguinte.
Todos estes dados sobre dr. Trussell estão aqui colocados para deixar claro que se alguém teria muito interesse em dizer que a droga não é abortiva, este alguém seria exatamente ele. No entanto, nem ele foi capaz disto. Pelo contrário, ele escreveu que as mulheres devem ser informadas sobre o efeito que a droga pode ter na implantação do óvulo fertilizado. Já em 2010, o dr. Trussell escrevia o seguinte:
“While some find the existing human and animal studies adequate to conclude that levonorgestrel ECPs have no post-fertilization effect, others may always feel that this question has not been unequivocally answered. The best available evidence indicates that levonorgestrel ECPs prevent pregnancy by mechanisms that do not involve interference with post-fertilization events.”
[“Enquanto alguns pensem que as pesquisas em humanos e animais permitem concluir que a pílula do dia seguinte não tenha efeito após a fertilização, outros não pensam que tal questão tenha sido respondida de forma inequívoca. A melhor evidência disponível indica que a pílula do dia seguinte previne uma gravidez através de mecanismos que não envolvam a interferência nos eventos pós-fertilização.”] (destaque meu)
Ou seja, não há conclusão definitiva sobre o assunto, embora haja fortes evidências, segundo a palavra do dr. Trussell.
Mas, curiosamente, mesmo diante da impossibilidade de dizer que a droga não atua no impedimento da implantação do óvulo fertilizado, o dr. Trussell e a dra. Raymond dizem que a droga não é abortiva. Como isto é possível? Simples: eles, justo antes do parágrafo onde era indicada a necessidade de informar às mulheres os efeitos da droga, escrevem isto:
“ECPs do not interrupt an established pregnancy, defined by medical authorities such as the United States Food and Drug Administration/National Institutes of Health87 and the American College of Obstetricians and Gynecologists88 as beginning with implantation. Therefore, ECPs are not abortifacient.
[“A pílula do dia seguinte não interrompe uma gravidez já estabelecida, que é definida por autoridades médicas tais como United States Food and Drug Administration/National Institutes of Health e o American College of Obstetricians and Gynecologists como tendo seu início a partir da implantação. Desta forma, a pílula do dia seguinte não é abortiva.”]
Ou seja, na impossibilidade de afirmar com 100% de certeza que a droga não atua na implantação, eles procuraram deslocar a discussão do momento em que já existe um novo ser humano – que é a concepção – para o momento em que autoridades médicas norte-americanas dizem que se pode considerar que existe uma gravidez, e a partir daí quiseram afirmar que a droga não é abortiva. Espertamente eles evitaram ter de lidar com o fato já conhecido pela ciência de que a vida humana tem seu início na concepção, e é a partir deste momento que esta vida deve ser preservada.
Chega a ser bem curiosa a forma como os pesquisadores tiveram de lidar com a questão. Da forma como eles colocam em seu texto, fica-se a imaginar que desde que o concepto não esteja ainda implantado no útero da mãe não se trata de um ser humano. Mas um novo ser humano não é gerado na implantação, mas sim na concepção, como dito pela Embriologia Humana. O que as autoridades médicas norte-americanas chamam de “gravidez já estabelecida” e que ocorre na implantação bem sucedida do óvulo fertilizado na parede do útero não é o marco inicial da geração de um novo ser humano, é um fato posterior. E é neste fato posterior que o princípio ativo da pílula do dia seguinte busca agir para impedir exatamente a implantação. Ou seja, a droga atua em um momento em que a existência de um novo ser humano é já uma realidade.
Deixando-se de lado que os pesquisadores espertamente deixaram de lado o momento da geração de um novo ser humano, que é o da concepção, e partindo de sua própria afirmação de que a droga não é abortiva (o que já se provou inconclusivo), é por demais peculiar que no parágrafo seguinte a esta afirmação eles escrevam que “(…) it is not scientifically possible to definitively rule out that a method may inhibit implantation of a fertilized egg in the endometrium” [(…) não é cientificamente possível deixar de lado que tal método possa inibir a implantação de um óvulo fertilizado no endométrio(…)].
Em versão anterior do mesmo artigo a linguagem era mais simples e mais clara ao falar sobre os efeitos da droga em questão: “(…) but may at times inhibit implantation of a fertilized egg in the endometrium.” [(…) mas pode por vezes inibir a implantação de um óvulo fertilizado no endométrio”. Pode ter ficado mais rebuscado o texto atual, mas o conteúdo permanece o mesmo: não há como afirmar com certeza absoluta que a droga não atue impedindo a implantação do óvulo fertilizado no útero. Nem mesmo dr. Trussell e a dra. Raymond ousaram chegar a tanto. Logo, a dúvida permanece.
Mas é exatamente neste ponto que está o mais peculiar do artigo de Trussell e Raymond. Se eles próprios admitem que não há como provar cientificamente que a droga não atua na implantação, como então eles afirmaram anteriormente que o medicamento não é abortivo? Se há a possibilidade de atuação na implantação, então há a possibilidade do aborto.
Foi exatamente por isto que eles evitaram ter de lidar com o fato de que a partir da concepção já existe um novo ser humano e preferiram começar seu raciocínio a partir do que autoridades médicas norte-americanas admitem como sendo uma “gravidez estabelecida”. E está aqui exatamente seu erro, pois a implantação no útero é meramente uma fase – uma fase importante, claro – no desenvolvimento natural de um ser humano que já existe. E é bom até que se diga que há casos raríssimos de gravidezes que ocorreram sem a implantação perfeita no útero, como foi o caso do bebê Azelan Cruz. Exemplos como este deixam bem claro o problema de se considerar a realidade de um novo ser humano em momento outro que o da concepção. Os pesquisadores simplesmente afirmaram algo que não podem provar.
Tudo isto aqui está colocado para que uma coisa fique bem clara: não há ainda como afirmar que a pílula do dia seguinte não cause abortos. Mesmo cientistas envolvidos na militância abortista e que promovem o uso desta droga como o dr. Trussell têm que dar o braço a torcer e admitir que não há ainda como provar cientificamente e sem que reste qualquer dúvida que esta droga não pode ter o efeito de eliminar um ser humano já concebido.
De posse destes dados, fica-se com a seguinte questão: havendo a possibilidade de se estar eliminando um ser humano frágil e inocente, é correta a utilização de tal droga? É evidente que não, pois isto seria como fazer roleta-russa com a vida deste ser já existente.
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