Como aconselhar a mulher que quer abortar? Sobre escuta ativa, caridade e verdade

Por María José Mansilla

Há algumas palavras que estão na moda e todo mundo repete; porém, na realidade, as pessoas não sabem muito bem o que significam e o que querem dizer.

Uma dessas palavras é “acompanhamento” e outra é “escuta ativa”, expressões as quais se oferece como solução para tudo.

Mais adiante abordarei o “acompanhamento”, hoje trataremos da “escuta ativa”: suas virtudes mas também, às vezes, suas nefastas consequências.

A famosa escuta ativa como técnica vem de Carl Rogers e sua psicologia humanista, que bebe do existencialismo. Simplificando muito e para que todos entendam: significa que a cura e a salvação estão dentro de nós e que ao falar os problemas se solucionam e tudo se cura. Sejamos claros, isso não é cristão e isso não é verdade.

É verdade que esta ressalta o saber ouvir e nos fornece uma série de técnicas para aprender a ouvir e a ter empatia, e isso é bom, mas não é suficiente e se baseia na falsa premissa de auto-salvação.

Ouvir é necessário, pois a pessoa precisa verbalizar o que está acontecendo com ela e, se queremos acompanhá-la e ajudá-la, precisamos saber o que realmente a preocupa, mas nos faltam dois elementos:

   1.  A salvação não vem da própria pessoa. A pessoa aceita ou não aceita a salvação que vem de Jesus Cristo e esta é uma decisão pessoal e livre, mas se ela não aceita a salvação e se converte, ela pode continuar falando infinitamente e não vai conseguir avançar.

   2.  Não precisamos apenas desabafar nossos pensamentos e sentimentos, o que obviamente é bom e nos faz bem, mas sim muitas vezes precisamos de orientação, pois, como dizem os grandes santos, “ninguém é um bom juiz de si mesmo”.

Se só nos dedicamos a ouvir e não orientamos, nos tornamos cúmplices ou, pelo menos, cooperadores diretos ou indiretos do mal que o outro realiza.

Acredito que esse tipo de pensamento se tornou padrão por causa do relativismo moral que faz com que se considerem todos os posicionamentos moralmente válidos, que cada um tem sua moral e princípios e tudo deve considerado igualmente respeitável.

Também está relacionado ao complexo que nós, católicos, frequentemente temos de que propor o Evangelho em todas as suas dimensões é impor nossa moral. Nada está mais longe da realidade. O Papa Paulo VI disse na Evangelii Nuntiandi: “Seria um erro impor qualquer coisa à consciência dos nossos irmãos. Mas propor a essa consciência a verdade evangélica e a salvação em Jesus Cristo, com absoluta clareza e com todo o respeito pelas opções livres que essa consciência fará… é uma homenagem a essa liberdade”.

Por trás dessas palavras (de que não se pode impor nossa moral) está a premissa de que as coisas são boas ou ruins de acordo com o que a pessoa acha que é, ou que os mandamentos da lei de Deus são apenas para nós mas que não se aplicam se a pessoa não acredita. Isso é falso! Se alguém bebe um copo de veneno, morre; saiba ou não que é veneno. Porém se ela sabe que é veneno, só então é livre para beber ou não.

Vamos dar um exemplo: um casal decide ir para a reprodução assistida. É claro que eles são livres para fazê-lo, mas não podemos pensar que, uma vez que eles não são católicos, isso seja bom para o casal. Uma coisa é entender e acompanhar o sofrimento e a cruz da infertilidade, e outra apoiar a fertilização in vitro. Porque para que um ato seja bom, o fim e os meios precisam ser, e se os meios não forem bons, o ato não será. E por falar em orientação, mais livres eles serão se se oferecer outras opções, como a Naprotecnologia, e se forem informados sobre o procedimento, no qual várias vidas são perdidas e de suas conseqüências.

Orientar alguém, dizer a verdade, longe de tirar a liberdade individual é justamente o contrário: é abrir à pessoa novos caminhos, novas opções e, finalmente, torná-la mais livres, pois aumenta o seu conhecimento e suas alternativas. O Evangelho diz “a verdade vos libertará”.

Essa falta de orientação em prol de uma suposta liberdade tem efeitos devastadores, vamos dar dois exemplos.

Quando uma mulher tem uma gravidez inesperada ou o bebê que ela está esperando é diagnosticado com uma doença ou deficiência, muitas pessoas boas lhe dizem a famosa frase: “a decisão é sua”, pensando que, dessa maneira, respeita a liberdade da mulher. É uma frase diabólica porque ignora o pai e deixa a mulher sozinha e, de fato, significa “a decisão é sua, portanto é seu problema; seja o que for que você decidir, enfrentará as consequências sozinha”.

Quando uma pessoa diante de uma doença ou uma deficiência grave se sente às vezes deprimida e perde a vontade de viver, não pode ser solicitada a decidir se quer viver ou morrer, porque também é apenas para se livrar do problema – quando o “problema” é uma pessoa que sofre. É curioso que não faríamos isso se essa pessoa, em vez de pedir [a morte] numa cama de hospital, estivesse prestes a pular de uma ponte. Neste caso não “respeitamos sua liberdade”, mas tentamos pará-la e avisamos a polícia para impedir o suicídio.

É significativo que esse princípio funcione em questões de ideologias relacionadas a cultura da morte. Todos nós gostamos de ser informados, de que nos contem suas experiências, que nos orientem na hora de tomar qualquer outra decisão; desde coisas pequenas, como comprar algo ou fazer um curso, até outras mais importantes, como criar um filho. Quem não precisa de uma mãe, uma vizinha, uma irmã, ou uma amiga para aconselhá-la sobre como cuidar melhor de seu bebê? Ou o que fazer quando ele chora? Ou quando não quer comer? Ou quando não dorme à noite?

Voltando ao tema da escuta, é necessário escutar, fazer perguntas, mas só isso não é suficiente. Além de escutar a si mesmo, as pessoas precisam de conselhos e orientações, não de minhas opiniões particulares, mas de meu conhecimento, de minha experiência e sobre tudo e antes de tudo da Verdade, da verdade com letras maiúsculas, a verdade do Evangelho. Não há maior obra de misericórdia do que dizer a verdade com caridade, isso sim, porque caridade e verdade são um binômio indissolúvel.

*María José Mansilla é coordenadora do Projeto Raquel na Espanha e presidente da Associação Spei Mater, que promove a Cultura da Vida e atende mulheres em risco de aborto.

Publicado originalmente em Religión en Libertad.

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